Para analistas, dinheiro liberado por Temer não previne rebeliões em presídios
Governo federal liberou na semana passada R$ 1,2 bilhão para estados construírem e modernizarem penitenciárias; especialistas defendem diminuir encarceramento.
O Especialistas na questão penitenciária avaliaram que os recursos liberados pelo governo federal para ampliação e construção de novos presídios não são suficientes para prevenir rebeliões como as que causaram a morte de, pelo menos, 56 pessoas entre domingo (1º) e segunda-feira (2) em Manaus (AM) (relembre a rebelião no vídeo acima).
Na semana passada, o presidente Michel Temer liberou R$ 1,2 bilhão para os estados erguem novas penitenciárias e modernizarem os atuais presídios com equipamentos de segurança. Ao anunciar o repasse, o governo federal afirmou que objetivo era amenizar a superlotação das prisões, que hoje têm capacidade somente para cerca de 360 mil pessoas.
De acordo com o Ministério da Justiça, cada unidade da federação vai receber o mesmo valor do governo federal: R$ 44,8 milhões. Os únicos estados que não terão direito ao dinheiro extra são Bahia e Ceará, que não têm fundos penitenciários.
Para os analistas a solução para o sistema prisional passa por mudanças nas leis penais e nas políticas públicas que possam levar à diminuição do encarceramento.
Segundo dados oficiais, atualmente, há cerca de 620 mil homens e mulheres presos no Brasil, sendo 240 mil (40%) de forma provisória (sem condenação, mas por período indefinido na cadeia).
"O problema é muito mais complexo que a questão exclusivamente orçamentária. Vamos enxugar gelo. Se construiremos 220 mil vagas, vamos zerar o déficit, mas é uma quimera, porque o número cresce exponencialmente desde os últimos 15 anos. Investir dinheiro na construção de cadeia não vai levar a lugar nenhum, porque ficar correndo atrás de zerar o déficit, o que nunca vai chegar", diz o professor da Universidade de São Paulo Alamiro Velludo Salvador Netto.
Coordenador Nacional da Pastoral Carcerária, o padre Valdir João Silveira também considera que aumentar o número de presídios levará ao aumento da violência, dentro e fora das penitenciárias.
"Presídio é lugar de violência. Você prende alguém para punir e castigar. Você não melhora alguém punindo e castigando", resume o padre.
Para Marcos Fuchs, da ONG Conectas Direitos Humanos, o investimento do governo é bem-vindo, mas "tardio".
"O pior investimento é não investir num sistema decente. O Brasil, desde o Império, nunca tratou desse tema com o respeito que merece, em todos os estados. A partir de agora, colocar dinheiro para construir novas unidades para o regime semiaberto, scanners, viaturas, pessoal adequado, é completamente tardio, porque o Brasil já tem mais de 600 mil presos. Então, o dinheiro jamais é suficiente para essa demanda", enfatizou.
O Especialistas na questão penitenciária avaliaram que os recursos liberados pelo governo federal para ampliação e construção de novos presídios não são suficientes para prevenir rebeliões como as que causaram a morte de, pelo menos, 56 pessoas entre domingo (1º) e segunda-feira (2) em Manaus (AM) (relembre a rebelião no vídeo acima).
Na semana passada, o presidente Michel Temer liberou R$ 1,2 bilhão para os estados erguem novas penitenciárias e modernizarem os atuais presídios com equipamentos de segurança. Ao anunciar o repasse, o governo federal afirmou que objetivo era amenizar a superlotação das prisões, que hoje têm capacidade somente para cerca de 360 mil pessoas.
De acordo com o Ministério da Justiça, cada unidade da federação vai receber o mesmo valor do governo federal: R$ 44,8 milhões. Os únicos estados que não terão direito ao dinheiro extra são Bahia e Ceará, que não têm fundos penitenciários.
Para os analistas a solução para o sistema prisional passa por mudanças nas leis penais e nas políticas públicas que possam levar à diminuição do encarceramento.
Segundo dados oficiais, atualmente, há cerca de 620 mil homens e mulheres presos no Brasil, sendo 240 mil (40%) de forma provisória (sem condenação, mas por período indefinido na cadeia).
"O problema é muito mais complexo que a questão exclusivamente orçamentária. Vamos enxugar gelo. Se construiremos 220 mil vagas, vamos zerar o déficit, mas é uma quimera, porque o número cresce exponencialmente desde os últimos 15 anos. Investir dinheiro na construção de cadeia não vai levar a lugar nenhum, porque ficar correndo atrás de zerar o déficit, o que nunca vai chegar", diz o professor da Universidade de São Paulo Alamiro Velludo Salvador Netto.
Coordenador Nacional da Pastoral Carcerária, o padre Valdir João Silveira também considera que aumentar o número de presídios levará ao aumento da violência, dentro e fora das penitenciárias.
"Presídio é lugar de violência. Você prende alguém para punir e castigar. Você não melhora alguém punindo e castigando", resume o padre.
Para Marcos Fuchs, da ONG Conectas Direitos Humanos, o investimento do governo é bem-vindo, mas "tardio".
"O pior investimento é não investir num sistema decente. O Brasil, desde o Império, nunca tratou desse tema com o respeito que merece, em todos os estados. A partir de agora, colocar dinheiro para construir novas unidades para o regime semiaberto, scanners, viaturas, pessoal adequado, é completamente tardio, porque o Brasil já tem mais de 600 mil presos. Então, o dinheiro jamais é suficiente para essa demanda", enfatizou.
Possíveis soluções
Os três especialistas sugerem como possíveis soluções para o caos nos presídios brasileiros mudanças nas leis e nas políticas públicas que sejam capazes de diminuir o aumento de prisões.
Os analistas concordam com a descriminalização do porte e uso de drogas, além de punições menos severas para condutas de menor gravidade.
"Presídio não é hospital. E todos os presídios têm droga dentro", diz o padre Valdir João Silveira.
No curto prazo, o religioso também defende reforço nas defensorias públicas, que prestam assessoria jurídica gratuita para a população de baixa renda.
Uma de suas principais atividades consiste na liberação, junto à Justiça, de presos que continuam encarcerados mesmo após o fim da pena ou que estão detidos por tempo indefinido antes de uma condenação.
"Em estados de fronteira, por exemplo no Amazonas, tínhamos cinco defensores para todo o estado", observa Silveira.
Fuchs, por sua vez, também defende a chamada "justiça restaurativa", por meio da qual, diz, haverá punições menos severas para crimes menores, em que o culpado é obrigado a reparar o mal causado.
"Pode ocorrer, por exemplo, obrigando um ladrão a trabalhar no supermercado onde furtou; ou um pichador a pintar o muro que depredou", exemplifica.
Em alguns países, já há experiências onde a própria comunidade se organiza para vigiar e punir delitos desse tipo, sem passar pelo Judiciário.
Para Alamiro Velludo Salvador Netto, a solução dentro dos presídios passa por melhores condições para os presos, de modo a evitar que recorram a facções.
"Do muro para dentro, é problema de política pública. Conceder dignidade mínima e não tratar que nem animais dentro do zoológico. É preciso que a família possa participar, fazer visita e não ser exposta a constrangimento. É tratar o preso como próximo", avalia Netto.
Os três especialistas sugerem como possíveis soluções para o caos nos presídios brasileiros mudanças nas leis e nas políticas públicas que sejam capazes de diminuir o aumento de prisões.
Os analistas concordam com a descriminalização do porte e uso de drogas, além de punições menos severas para condutas de menor gravidade.
"Presídio não é hospital. E todos os presídios têm droga dentro", diz o padre Valdir João Silveira.
No curto prazo, o religioso também defende reforço nas defensorias públicas, que prestam assessoria jurídica gratuita para a população de baixa renda.
Uma de suas principais atividades consiste na liberação, junto à Justiça, de presos que continuam encarcerados mesmo após o fim da pena ou que estão detidos por tempo indefinido antes de uma condenação.
"Em estados de fronteira, por exemplo no Amazonas, tínhamos cinco defensores para todo o estado", observa Silveira.
Fuchs, por sua vez, também defende a chamada "justiça restaurativa", por meio da qual, diz, haverá punições menos severas para crimes menores, em que o culpado é obrigado a reparar o mal causado.
"Pode ocorrer, por exemplo, obrigando um ladrão a trabalhar no supermercado onde furtou; ou um pichador a pintar o muro que depredou", exemplifica.
Em alguns países, já há experiências onde a própria comunidade se organiza para vigiar e punir delitos desse tipo, sem passar pelo Judiciário.
Para Alamiro Velludo Salvador Netto, a solução dentro dos presídios passa por melhores condições para os presos, de modo a evitar que recorram a facções.
"Do muro para dentro, é problema de política pública. Conceder dignidade mínima e não tratar que nem animais dentro do zoológico. É preciso que a família possa participar, fazer visita e não ser exposta a constrangimento. É tratar o preso como próximo", avalia Netto.
Rebeliões
Sobre as rebeliões nas penitenciárias brasileiras, o diretor da Conectas Marcos Fuchs aposta em mais inteligência das forças de segurança e organização de modo a separar membros das facções criminosas.
"Precisa ter investimento em investigação, pesquisa, cruzamento de dados, estados conversando com respectivos secretários e inteligência. Começar a entender e mapear quem são esses grupos, como estão agindo fora para não refletir dentro do presídio. Não me parece eficiente colocar dois grupos separados por portão, e um sai totalmente descontrolado", diz Fuchs.
O padre Valdir Silveira acrescenta que uma solução de médio e longo prazo passa pela garantia de direitos sociais. Para ele, assim como nas periferias, a ausência de uma assistência social adequada pelo Estado nas prisões leva as pessoas a recorrerem a grupos criminosos.
"Como surgiram as facções? Pela ausência do Estado dentro do sistema prisional. Preso cuida de preso. Quando o governo e a família não fornecem o kit básico dos presos – papel higiênico, sabonete, absorvente –, é o grupo organizado que fornece", conclui.
Alamiro Velludo Salvador Netto aponta o que considera outro erro no tratamento da questão: a concessão da gestão dos presídios para a iniciativa privada, como ocorreu em 2014 no Complexo Anísio Jobim, onde ocorreram as mortes em Manaus, consideradas pelo governo local "o maior massacre" do sistema prisional do estado.
"O abandono da questão penitenciária pelo Estado chega a tal ponto em que ele quer se despir dessa obrigação. O poder de punir é elemento essencial do Estado, assim como não se pode privatizar a Justiça [...] Na medida em que o Estado perdeu o controle do cárcere, o problema surge com a disputa interna pelo controle pelas facções", opina o professor.
Sobre as rebeliões nas penitenciárias brasileiras, o diretor da Conectas Marcos Fuchs aposta em mais inteligência das forças de segurança e organização de modo a separar membros das facções criminosas.
"Precisa ter investimento em investigação, pesquisa, cruzamento de dados, estados conversando com respectivos secretários e inteligência. Começar a entender e mapear quem são esses grupos, como estão agindo fora para não refletir dentro do presídio. Não me parece eficiente colocar dois grupos separados por portão, e um sai totalmente descontrolado", diz Fuchs.
O padre Valdir Silveira acrescenta que uma solução de médio e longo prazo passa pela garantia de direitos sociais. Para ele, assim como nas periferias, a ausência de uma assistência social adequada pelo Estado nas prisões leva as pessoas a recorrerem a grupos criminosos.
"Como surgiram as facções? Pela ausência do Estado dentro do sistema prisional. Preso cuida de preso. Quando o governo e a família não fornecem o kit básico dos presos – papel higiênico, sabonete, absorvente –, é o grupo organizado que fornece", conclui.
Alamiro Velludo Salvador Netto aponta o que considera outro erro no tratamento da questão: a concessão da gestão dos presídios para a iniciativa privada, como ocorreu em 2014 no Complexo Anísio Jobim, onde ocorreram as mortes em Manaus, consideradas pelo governo local "o maior massacre" do sistema prisional do estado.
"O abandono da questão penitenciária pelo Estado chega a tal ponto em que ele quer se despir dessa obrigação. O poder de punir é elemento essencial do Estado, assim como não se pode privatizar a Justiça [...] Na medida em que o Estado perdeu o controle do cárcere, o problema surge com a disputa interna pelo controle pelas facções", opina o professor.
Opinião de juízes
Nesta terça, após as rebeliões, entidades que representam os juízes – que dão a palavra final sobre quem vai preso – também manifestaram críticas à forma como as prisões são ocupadas atualmente.
A Associação Juízes para a Democracia (AJD) atacou a "política punitivista" do país que, conforme a entidade, trata problemas sociais como "caso de polícia".
A AJD diz que a população carcerária do Brasil, quarta maior do mundo, "é formada basicamente pelos excluídos dos mercados de trabalho e de consumo, jogados, em abandono, para as redes de organizações criminosas que comandam estabelecimentos penitenciários que se assemelham a masmorras medievais".
O presidente da Associação de Juízes Federais (Ajufe), Roberto Veloso, avalia que o sistema prisional está "falido" porque "nem pune e nem recupera" os presos. Para Veloso, é preciso isolar os líderes das facções.
"O sistema penitenciário brasileiro vive momentos de intensa ineficiência, quando facções criminosas dominam os presídios estaduais. Nesse contexto, as penitenciárias federais de segurança máxima têm se mostrado uma experiência exitosa, verdadeiras ilhas de excelência em um sistema falido que nem pune e nem recupera", afirma Veloso.
Nesta terça, após as rebeliões, entidades que representam os juízes – que dão a palavra final sobre quem vai preso – também manifestaram críticas à forma como as prisões são ocupadas atualmente.
A Associação Juízes para a Democracia (AJD) atacou a "política punitivista" do país que, conforme a entidade, trata problemas sociais como "caso de polícia".
A AJD diz que a população carcerária do Brasil, quarta maior do mundo, "é formada basicamente pelos excluídos dos mercados de trabalho e de consumo, jogados, em abandono, para as redes de organizações criminosas que comandam estabelecimentos penitenciários que se assemelham a masmorras medievais".
O presidente da Associação de Juízes Federais (Ajufe), Roberto Veloso, avalia que o sistema prisional está "falido" porque "nem pune e nem recupera" os presos. Para Veloso, é preciso isolar os líderes das facções.
"O sistema penitenciário brasileiro vive momentos de intensa ineficiência, quando facções criminosas dominam os presídios estaduais. Nesse contexto, as penitenciárias federais de segurança máxima têm se mostrado uma experiência exitosa, verdadeiras ilhas de excelência em um sistema falido que nem pune e nem recupera", afirma Veloso.
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