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'Nos veem como atração de circo', diz morador de ocupação na Oscar Freire


Sem-teto devem deixar prédio na esquina com a Peixoto Gomide até 1º de maio após acordo na Justiça. 'Não é certo as pessoas invadirem e morarem dessa forma, quase uma favela', disse vizinha.
Na porta de entrada de um prédio na Rua Oscar Freire com a Rua Peixoto Gomide, área nobre da Zona Oeste de São Paulo, há colagens de páginas 
de revistas de moda. Modelos e manequins enfeitam a entrada da ocupação
 de sem-teto que completou um ano em fevereiro e está prestes a acabar.
“Estava tudo muito feio, quis fazer um lambe-lambe com personalidades de moda. A ideia é fazer com que esses moradores com padrão aristocrático
 olhem com menos energia negativa pra gente”, disse o designer Armando de Souza, 56, o primeiro morador a integrar a ocupação. Cerca de 120 pessoas moram no prédio, com nove apartamentos, e dizem não ser representados
 por nenhum movimento de moradia. O metro quadrado na Rua Oscar Freire custa em média R$ 11 mil.
A arte tenta servir como uma espécie de para-raio do preconceito que,
 segundo Armando, a vizinhança emana. “Os moradores dos Jardins têm um padrão social sofisticado, aristocrático e eles olham a gente como se
 fossemos uma atração circense. Não cumprimentam a gente. Olham com desprezo”, disse.
Descarga negativa ou juízo de valor(es), donos e gerentes de loja não acham “certo eles morarem ali”. “Eu pago IPTU de quase R$ 1.000 e vem uma
 pessoa que mora de graça, deixar lixo? Não por eles, é um problema social 
do Brasil que eu não vou resolver, mas eles não têm uma postura para morar aqui”, disse a dona de uma loja vizinha que não quis se identificar.
“A gente tem medo. Sempre tocam um funk altíssimo. Também não dá para
 abrir a porta porque é um cheiro terrível”, disse outro vizinho
“Não é certo as pessoas invadirem e 
morarem dessa forma, que nem na
 periferia, quase uma favela. Não é coerente
 o jeito que eles moram, o lixo que eles 
deixam, com a região. Eu pago o IPTU caríssimo para manter tudo certo e ter 
uma vizinhança desse tipo? Desculpa, eles 
não estão coerentes com o bairro. Se há problema de moradia na cidade, não sou 
eu quem vou resolver, mas aqui eles não podem ficar porque não é certo”, 
disse dona 
de loja da Oscar Freire.
Os moradores não acham nem certo e nem errado estarem ali: "É por
 questão de necessidade", disse Paulo, morador da ocupação e monitor 
de empresa de segurança.
O grupo que hoje ocupa o prédio saiu de uma ocupação no Hospital Panamericano, em Alto de Pinheiros no final de 2015. "Fomos jogados 
na rua. Ficamos quase duas semanas na calçada. Não podíamos 
escovar os dentes, não podíamos fazer comida, trocar de roupa, ir 
trabalhar. Era um caos muito grande", conta Armando.
Depois, encontrou um imóvel na hípica paulista, na região do Butantã, 
mas não havia condições de moradia. Logo foram avisados sobre o
 prédios nos Jardins e partiram para a área nobre. "Umas 23h entramos
 por essa porta aqui [a da entrada]. A porta estava aberta. Entramos sem
 fazer nenhuma ação de agressividade com ninguém, não havia
 ninguém", disse.

O prédio

Desde 2004, não há ninguém morando em paz no edifício. Naquele ano,
 a Santa Alice Empreendimentos Imobiliários queria comprar todo o 
prédio para fazer um imóvel de luxo, mas só conseguiu aquirir sete dos
 nove apartamentos. Os apartamentos 21 e 31 optaram por não vender 
e, como consequência dessa recusa, começou a "escaramuça", segundo
 Pedro Giberti, advogado de um dos proprietários minoritários. 
Procurada, a Santa Alice não quis se pronunciar.
Como era proprietária de quase todos os apartamentos e tinha a maioria 
dos votos nas assembleias do condomínio, a Santa Alice conseguiu 
aprovar a cobrança de cerca de R$ 7 mil de taxa condominial para a 
contratação de uma empresa de segurança, valor considerado
 exorbitante pelos proprietários minoritários, explica Giberti.

Dois proprietários seguiram resistindo. A imobiliária arregimentou 
moradores de rua e em 2007 o primeiro grupo entrou no prédio, segundo
 o advogado. "Eles usaram os moradores como massa de manobra, 
entraram no prédio e virou um pardieiro. Vizinhos começaram a reclamar
 que estava se formando um ponto de venda de drogas . Também 
degradaram as instalações elétricas e fizeram 'gato'. Alguém acionou a
 Prefeitura, o prédio foi interditado e removeram todas as pessoas que
 estavam lá. O prédio voltou a ficar desocupado, ficou completamente 
destruído e se tornou inabitável", conta Giberti.
Os proprietários minoritários ficaram impedidos de usar o apartamento e entraram com uma ação para anular a assembleia que garantiu a 
cobrança de R$ 7 mil para o condomínio. Depois, os dois entraram com
 uma ação indenizatória contra a Santa Alice para colocar o edifício como
 estava antes da ocupação. A Justiça acatou, mas a empresa demorou a 

garantir a habitabilidade do prédio. "A Santa Alice consertou a parte elétrica
, mas os apartamentos estavam destruídos. Eles precisariam fazer uma 
mega reforma", disse Gibert.
Após cinco anos interditado, de 2008 a 2013, a Prefeitura liberou o 
prédio. Em fevereiro de 2015, a União dos Sem Teto ocupou o imóvel
 e, meses depois, deixou o local após determinação de reintegração 
de posse.
Um ano mais tarde, os atuais moradores entraram no edifício.
 No início de 2017, o juiz marcou uma audiência de conciliação e houve
 acordo. O grupo tem que deixar o prédio até 1º de maio, data limite 

para o cumprimento da reintegração de posse.
Para o advogado, os sem-teto já sabem que vão ter que deixar o
 imóvel pouco tempo depois. "Fiz uma pesquisa de várias ações. Eles
 já invadem sabendo que vão conseguir a reintegração de posse. 
Então, eles sabem que vão morar só um tempo. Tem um ativo 
circulante, tem uma gama de imóveis para ocupar. Eles ficam seis 
meses, um ano, e depois saem", disse.
O futuro do prédio segue incerto. Os apartamentos podem ser
 alugados ou os minoritários podem decidir vender.
"Mas não vão vender por um preço vil. O metro quadrado está 
relacionado com o que você pode fazer no imóvel. Se você pode 
construir um prédio de 3 andares, o valor é um, se for de 10 andares, 
o valor é outro", afirma Gibert.

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